Pressão redefinida
11/11/2025
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Cultos on-line, apps bíblicos e doações digitais redefinem a vivência cristã e a evangelização

Foto: CMP / Adobe Stock

Por Victor Rodrigues

A pandemia de covid-19 – que durou dois anos (de março de 2020 a abril de 2022) – catalisou uma transformação profunda nas comunidades cristãs, impulsionando a adoção de soluções digitais que redefiniram as práticas de adoração, convivência e evangelização. As igrejas, que sempre tiveram o contato físico e a comunhão presencial como pilares, viram-se diante do desafio de manter a congregação unida em um cenário de isolamento social. A resposta veio por meio da tecnologia, que, de maneira quase abrupta, integrou-se à rotina eclesiástica. O que antes era somente uma alternativa emergencial se tornou uma ferramenta necessária, moldando a experiência de fé contemporânea a partir de transmissões ao vivo, recursos para leitura e estudo da Bíblia via aplicativos, grupos virtuais de oração e até o uso da inteligência virtual (IA) direcionada ao cuidado espiritual.

A tecnologia deixou de ser acessória: transformou-se em um elemento fundamental do dia a dia da Igreja moderna. É o que pensa o Pr. Maurício Abreu de Carvalho, da Igreja Batista Nacional da Pauliceia, em São Bernardo do Campo (SP). De acordo com ele, mesmo com o retorno aos cultos presenciais, o on-line segue ativo, especialmente entre idosos, enfermos e membros que moram distantes. “Temos um grupo anual de leitura das Escrituras com 200 participantes. Oferecemos comentários contextuais sobre o texto bíblico e abrimos espaço para interação, a fim de que eles tirem dúvidas”, esclarece o ministro batista, acrescentando que, ao final dos encontros, os participantes recebem um certificado de conclusão da jornada bíblica.

O Pr. Maurício Abreu de Carvalho ressalva: “O culto on-line traz desafios significativos, como o ambiente doméstico, as distrações e o próprio formato virtual, que dificultam o engajamento e a vivência plena da adoração. Por isso, não se compara à reunião presencial”
Foto: Arquivo pessoal – modificada por IA

Ao ser indagado sobre as mídias digitais, Maurício Carvalho afirma ver com bons olhos a formação de comunidades nas redes sociais, desde que sejam bem administradas e tenham regras claras. “São ótimos instrumentos para oração, compartilhamento de informações da igreja, divulgação de conteúdo produzido pela congregação, devocionais e muito mais”, opina. No entanto, ele faz uma ressalva: “O culto on-line traz desafios significativos, como o ambiente doméstico, as distrações e o próprio formato virtual, que dificultam o engajamento e a vivência plena da adoração. Por isso, não se compara à reunião presencial”.

O Pr. Vanderlei Duarte, líder estadual da Igreja Internacional da Graça de Deus (IIGD) em Sergipe, também acredita que iniciativas digitais não substituem o abraço ou o aperto de mãos. Porém, segundo ele, representam uma alternativa valiosa para preservar o vínculo espiritual e fraternal em tempos difíceis. “Em nossa comunidade de fé, temos criado grupos de discipulado no WhatsApp, grupos de oração no Zoom [app de videochamadas e reuniões on-line] e atendimentos pastorais por chamadas de vídeo”, revela Duarte, o qual defende que é preciso formar uma “plataforma de muitos líderes”, para que o cuidado espiritual e a amizade possam acontecer em todas as frentes – tanto no templo quanto nas redes. “Quando a Igreja compreende que cada um é parte do Corpo de Cristo, o Reino de Deus avança.”

O Pr. Vanderlei Duarte acredita que iniciativas digitais não substituem o abraço ou o aperto de mãos, mas representam uma alternativa valiosa para preservar o vínculo espiritual e fraternal em tempos difíceis
Foto: Arquivo pessoal – modificada por IA

Na opinião do pregador, aplicativos e redes sociais são ferramentas eficazes para transformar seguidores em discípulos, formando-os por meio de vídeos devocionais, lives, estudos e atendimentos pastorais virtuais. “O digital não vem para substituir o templo físico, mas para ampliá-lo”, assevera, esclarecendo que não se trata apenas de alcançar recordes de números e curtidas, mas de fortalecer famílias, fazendo-as serem guiadas pelo Espírito Santo. “Creio que a transmissão on-line foi uma das estratégias mais importantes que o Senhor nos deu durante a pandemia”, avalia o pastor, lembrando que o Missionário R. R. Soares foi um visionário ao investir na televisão e levar o Evangelho para todos os cantos do país, inclusive pela internet.

Da mesma forma, o Pr. Marcio Alves, da Igreja da Graça em Jardim Presidente Dutra, na cidade de Guarulhos (SP), destaca as transmissões televisivas dos cultos como instrumentos usados por Deus para alcançar milhões de pessoas ao redor do mundo. Para o ministro, isso evidencia a importância de os líderes estarem atentos às tendências do avanço tecnológico e aos meios de comunicação. “A igreja precisa acompanhar as transformações e aprimorar continuamente suas formas de se comunicar. Eu mesmo, todos os dias, utilizo minhas redes sociais para alcançar pessoas que, talvez, nunca conheça pessoalmente, mas que estão sendo alimentadas pelas Escrituras. Isso é incrível”, pontua ele, acrescentando que a tecnologia, especialmente na web, tem uma importância fundamental. “Até quem tem pouca habilidade consegue acessar a Bíblia e viver experiências significativas on-line”, garante Alves, o qual defende a ideia de que devemos unir o conhecimento tecnológico ao saber teológico como estratégia para fortalecer a missão da igreja, acompanhando as transformações digitais, mas sem perder a essência do Evangelho.

O Pr. Marcio Alves pontua: “A igreja precisa acompanhar as transformações e aprimorar continuamente suas formas de se comunicar”
Foto: Reprodução / Instagram

Vivência da fé – A chegada do culto virtual acelerou mudanças na igreja e introduziu novas práticas, como o uso de aplicativos de estudos bíblicos, evangelização nas mídias sociais, doações via PIX e a utilização de plataformas digitais, como Instagram, Facebook e YouTube, as quais passaram a integrar o dia a dia das comunidades cristãs.Contudo, apesar desse avanço, é necessário entender o papel da tecnologia na vivência da fé. É o que aponta Pedro Franco, cofundador da inChurch, empresa especializada em inovação e tecnologia voltada para igrejas. Segundo ele, há muitas maneiras de potencializar a atuação das congregações por meio do ambiente tecnológico. “Depois da pandemia, alguns líderes passaram a acreditar que ser igreja nesse espaço significava apenas transmitir cultos pelo YouTube. Isso faz parte da atuação denominacional no digital, mas o virtual também abrange o momento em que o culto não está acontecendo”, esclarece.

Pedro Franco, cofundador da inChurch, empresa especializada em inovação e tecnologia voltada para igrejas, afirma: “O objetivo é integrar o virtual ao espiritual de maneira significativa, de modo que o digital não seja um fim em si mesmo”
Foto: Arquivo pessoal

Franco salienta que há diversas estratégias digitais capazes de conectar a comunidade cristã às necessidades reais da sociedade. “Uma das formas mais eficazes é perceber as manifestações de dores das pessoas e lhes responder a partir da fé. Por exemplo, se alguém busca no Google modos de lidar com um sofrimento, a igreja pode oferecer conteúdos que acolham essa necessidade, como testemunhos de superação em Cristo”, ensina o especialista. Ele ressalta que as redes sociais cumprem o papel antes pertencente às praças, às ruas e até aos shoppings – espaços de convivência e diálogo onde as pessoas naturalmente se encontram. Pensando nisso, Franco criou uma plataforma tecnológica para as igrejas, oferecendo recursos, como módulos de lives interativas e pedidos de oração, tornando o culto uma experiência não apenas transmitida, mas realmente vivenciada. “O objetivo é integrar o virtual ao espiritual de maneira significativa, de modo que o digital não seja um fim em si mesmo, mas um meio para vivermos algo mais próximo da Igreja primitiva.”

Compartilhando essa perspectiva, o gerente de Tecnologia da Informação (TI) da Igreja da Graça, Gustavo Kaller, lembra que as ferramentas tecnológicas desempenham um papel essencial na otimização de processos, permitindo, assim, que a liderança se concentre em sua missão principal: propagar o Evangelho. “Além das transmissões ao vivo dos cultos, a IIGD desenvolveu e mantém um ecossistema digital completo, incluindo aplicativos móveis, plataformas de ensino bíblico, canais no YouTube, redes sociais e ferramentas de doação digital”, expõe Kaller, acrescentando que a Igreja da Graça conta com a plataforma da operadora Nossa TV, os conteúdos cristãos sob demanda e o portal de notícias Ongrace. “Eles permitem o acesso contínuo à Palavra para estudo, edificação pessoal e evangelização, independentemente da hora e do lugar.”

Foto: Intelligent Horizons / Gerado com IA / Adobe Stock

Neste cenário, no qual fé e tecnologia caminham lado a lado, Kaller enfatiza que o importante é fazer dessas inovações aliadas no fortalecimento da comunicação da Igreja com seus membros e visitantes. “O mover do Espírito produz o crescimento, porém a estrutura organiza e sustenta o desenvolvimento”, analisa ele, antecipando planos de expansão da IIGD para a estrutura mobile [infraestrutura de hardware e de software], possibilitando o acesso à experiência digital em dispositivos móveis, a implementação de novos canais de atendimento com inteligência artificial (IA) e a modernização dos sistemas internos, com objetivo de criar experiências mais conectadas e humanizadas.

Gustavo Kaller analisa: “O mover do Espírito produz o crescimento, porém a estrutura organiza e sustenta o desenvolvimento”
Foto: Reprodução / Instagram

Segundo o gerente de TI, a Igreja da Graça tem atuado com rigor para preservar a integridade de sua comunidade on-line, tratando com seriedade a moderação de conteúdo no ambiente digital, lançando mão de políticas claras, sistemas automatizados e intervenção humana. “A atuação preventiva identifica abusos, discursos de ódio e conteúdos impróprios. Já as ações de educação digital fortalecem uma cultura de respeito mútuo nas plataformas da Igreja, garantindo um ambiente seguro e respeitoso para seus membros”, conclui Kaller.


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