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Jornal das Boas-Novas – 263
01/06/2021
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15/07/2021
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Foto: Arquivo Graça / Marcos AC

Culto racional

Pastores e especialistas defendem a manutenção de um ensinamento consistente das doutrinas bíblicas nos púlpitos

Por Evandro Teixeira

A palavra doutrina, originária do termo grego didaquê, significa ensino ou instrução. Trata-se, porém, de um conceito muito amplo empregado em diferentes áreas (inclusive na maioria das religiões) para definir aquilo que serve de base para suas crenças. No caso do cristianismo, sua fonte de doutrina é a Bíblia Sagrada. Espera-se, portanto, que seus pastores e mestres sejam aptos para ensinar aos fiéis os princípios basilares da fé contidos nas Escrituras. 

O apóstolo Paulo sempre expressou sua preocupação com o ensinamento bíblico genuíno, como registra Atos 20.20,21 (ARA): Jamais deixando de vos anunciar coisa alguma proveitosa e de vo-la ensinar publicamente e também de casa em casa, testificando tanto a judeus como a gregos o arrependimento para com Deus e a fé em nosso Senhor Jesus Cristo. O mesmo sentimento é mantido em suas cartas, quando destaca a importância de ensinar e preservar a doutrina bíblica. O princípio fica claro em sua mensagem endereçada a Tito: Tu, porém, fala o que convém à sã doutrina (Tt 2.1). 

Em sua carta a Timóteo, Paulo informa que convém ao bom ministro do Senhor não dar ouvidos a doutrinas de demônios (1 Tm 4.1) e pregar a verdade. Fazendo isso, será bom ministro de Jesus Cristo, criado com as palavras da fé e da boa doutrina que tens seguido (1 Tm 4.6 – ARA). No mesmo capítulo, ele continua: Tem cuidado de ti mesmo e da doutrina; persevera nestas coisas; porque, fazendo isto, te salvarás, tanto a ti mesmo como aos que te ouvem (1 Tm 4.16). Na correspondência seguinte ao amigo, o apóstolo recomenda: Tu, pois, meu filho, fortifica-te na graça que há em Cristo Jesus. E o que de mim, entre muitas testemunhas, ouviste, confia-o a homens fiéis, que sejam idôneos para também ensinarem os outros (2 Tm 2.1,2). 

O pastor norte-americano Bill Giovannetti afirma que, por contrariar as recomendações de Paulo, muitas igrejas têm perdido o foco da verdadeira doutrina cristã: sermões mais práticos e menos doutrinários
Foto: Divulgação

Entretanto, há quem considere os pregadores do século 21 pouco idôneos para a tarefa do ensino. É o que pensa o pastor norte-americano Bill Giovannetti, professor de Teologia e fundador da Escola de Ministério Bíblico Veritas, um seminário com sede em Redding, no estado da Califórnia (EUA). Para o líder, por contrariar as recomendações de Paulo, muitas igrejas têm perdido o foco da verdadeira doutrina cristã. Em entrevista ao portal de notícias norte-americano The Christian Post, Giovannetti declarou: Os sermões são mais práticos e menos doutrinários. Ao mesmo tempo, nossa música de adoração se tornou mais emocional e menos teológica. Estamos estimulando o apetite pelas coisas erradas. Segundo ele, o ensino bíblico parece ter se tornado superficial em muitas comunidades evangélicas: Alguns líderes deixam de se aprofundar no ensino doutrinário para a congregação por achar que as pessoas não têm capacidade de absorver o conteúdo como deveriam.

O Rev. Gabriel Aquino da Cruz explica que existem comunidades evangélicas que “tentam se enquadrar nos parâmetros pós-modernos de entendimento e interpretação bíblica”
Foto: Arquivo pessoal

Pregação expositiva – O Rev. Gabriel Aquino da Cruz, da Igreja Presbiteriana do Jardim Itapuã, em Santo André (SP), concorda que os púlpitos foram invadidos por uma visão mais pragmática em algumas comunidades evangélicas. “São igrejas que tentam se enquadrar nos parâmetros pós-modernos de entendimento e interpretação bíblica. Para elas, o foco está na compreensão do leitor e não no texto”, explica Cruz, mestre em Ciências da Religião. 

De acordo com o líder, esse tipo de ensinamento acaba enfraquecendo a ênfase em muitos princípios que as igrejas históricas e pentecostais tradicionais mantêm, como a inerrância e a infalibilidade do Texto Sagrado. Por isso, em sua opinião, convém às lideranças estarem mais atentas e reafirmarem a importância da pregação expositiva e clara das Escrituras. “É possível fazer uma aplicação mais próxima da realidade das pessoas sem perder a riqueza e a profundidade dos ensinos contidos na Bíblia.”

Para o Pr. Otávio Pio Dutra, líder estadual da Igreja Internacional da Graça de Deus (IIGD) em João Pessoa (PB), quem pretende ensinar a doutrina cristã precisa, em primeiro lugar, ter intimidade com Cristo. “Só por meio da presença verdadeira do Senhor Jesus em nosso coração, sem superficialidades, podemos nos manter firmes e ter profundidade em nossa comunhão com o Altíssimo”, declara o líder, fazendo menção ao texto de 1 Pedro 3.15: Antes, santificai a Cristo, como Senhor, em vosso coração; e estai sempre preparados para responder com mansidão e temor a qualquer que vos pedir a razão da esperança que há em vós.

O Pr. Otávio Pio Dutra declara que “só por meio da presença verdadeira do Senhor Jesus em nosso coração, sem superficialidades, podemos nos manter firmes e ter profundidade em nossa comunhão com Deus
Foto: Arquivo pessoal

Para o professor e mestre em Ciências da Religião Lucas Merlo Nascimento, aquele que prega a Palavra precisa ver o homem em suas dimensões psíquica, espiritual, física e social de modo que todas elas sejam alcançadas pela mensagem. Para tanto, Nascimento defende a necessidade do estabelecimento de uma boa estratégia comunicacional. “Conteúdo sem uma boa comunicação não atinge as pessoas. Uma boa apresentação sem conteúdo é uma performance vazia”, analisa ele, membro da Igreja Batista 21, em Perdizes, São Paulo (SP). Contudo, o professor lembra que, na tentativa de comunicar bem a mensagem cristã e torná-la relevante aos ouvintes, muitos pregadores têm sacrificado o ensino da sã doutrina, substituindo-a por apelos ralos e de forte caráter emocional. 

O professor e mestre em Ciências da Religião Lucas Merlo Nascimento diz: “Conteúdo sem uma boa comunicação não atinge as pessoas. Uma boa apresentação sem conteúdo é uma performance vazia”
Foto: Arquivo pessoal

Razão e emoção – O Rev.José Paulo Brocco, da Primeira Igreja Presbiteriana Conservadora de São Paulo (SP), ressalta que razão e emoção são igualmente importantes para o ser humano. Contudo, priorizar um em detrimento de outro certamente trará consequências ruins. “Uma mensagem focada apenas no emocional tira do ser humano a capacidade de examinar tudo criteriosamente. Por outro lado, o apego ao racional pode produzir uma mente insensível.” No entanto, embora reconheça que, em um ensinamento, deva haver espaço para os dois elementos, o pastor ressalta que o emocional não deve sobrepujar o racional. “Quando lemos a Bíblia, podemos perceber que a razão predomina. Todavia, as emoções não são ignoradas.”

Rev. José Paulo Brocco: “Uma mensagem focada apenas no emocional tira do ser humano a capacidade de examinar tudo criteriosamente. Por outro lado, o apego ao racional pode produzir uma mente insensível”
Foto: Arquivo pessoal

Na visão da pedagoga Sandra dos Santos Pinto da Conceição, da Igreja Batista Herança da Graça, em São Gonçalo (RJ), apelar apenas para o emocional vai na contramão do que orienta a Palavra de Deus. Afinal, o Livro Sagrado defende a racionalidade, como registra o apóstolo Paulo em Romanos 12.1: Rogo-vos, pois, irmãos, pela compaixão de Deus, que apresenteis o vosso corpo em sacrifício vivo, santo e agradável a Deus, que é o vosso culto racional. A pedagoga admite, entretanto, não ser fácil encontrar equilíbrio entre razão e emoção. “Somos oscilantes por natureza. Vivemos mais momentos de sensatez quando nos deixamos ser dirigidos pelo Espírito Santo. Para nos mantermos equilibrados, temos de estabelecer uma vida de meditação na Palavra e oração.”

A pedagoga Sandra dos Santos Pinto da Conceição afirma: “Somos oscilantes por natureza. Vivemos mais momentos de sensatez quando nos deixamos ser dirigidos pelo Espírito Santo. Para nos manter equilibrados, temos de estabelecer uma vida de meditação na Palavra e oração”
Foto: Arquivo pessoal

A psicóloga Flávia Anita Puça, da Igreja Presbiteriana em Jardim Atlântico, em Olinda (PE), adverte que, entre a mente e o coração, o ser humano tem uma maior tendência a ser guiado pela emoção. Ela afirma, todavia, que razão e emoção podem ser aliadas no aprendizado das doutrinas bíblicas. “Quando o ser humano alimenta seu cérebro com esses dois elementos, de forma equilibrada, isso facilita a aprendizagem de novos conhecimentos.”

A psicóloga Flávia Anita Puça destaca: “Quando o ser humano alimenta seu cérebro com esses dois elementos [razão e emoção], de forma equilibrada, isso facilita a aprendizagem de novos conhecimentos”
Foto: Arquivo pessoal

Necessidade de equilíbrio – O Rev. Eber Cocareli, diretor e apresentador do Programa Vejam Só!, exibido pela Rede Internacional de Televisão (RIT), observa que, na Igreja Internacional da Graça de Deus, há uma preocupação intensa e constante em levar a Palavra aos fiéis, com seriedade. “Para quem pisa na Igreja da Graça pela primeira vez, fica nítido que as mensagens dos pastores e de seus auxiliares não traduzem opiniões, mas a verdade bíblica.” 

O apresentador acrescenta que o ensinamento transmitido pelos líderes da IIGD aos obreiros segue o entendimento de que a Bíblia é a expressão escrita do Senhor Jesus. “Se alguém quiser conhecer Deus e Sua vontade, deverá ir às Escrituras, e não a profecias e revelações, tão comuns em algumas comunidades de fé”, observa o apresentador, que também defende a necessidade de equilíbrio entre mente e coração. Segundo Cocareli, os livros poéticos da Bíblia estão lá para mostrar que o Eterno leva em consideração o sentimento humano. “Doutrina sem emoção é letra morta; emoção sem doutrina é emocionalismo”, adverte.  

Rev. Eber Cocareli: “Para quem pisa na Igreja da Graça pela primeira vez, fica nítido que as mensagens dos pastores e de seus auxiliares não traduzem opiniões, mas a verdade bíblica”
Foto: Arquivo Graça / Solmar Garcia

O Pr. Narciso Vanelli, líder regional da IIGD em Governador Valadares (MG), concorda com o Rev. Eber e destaca que a Palavra de Deus é capaz de tratar todos os aspectos do ser humano. “Quando a Palavra é ministrada, o Espírito Santo traz a mensagem do  Senhor ao coração daquele que a ouve”, observa Vanelli. No entanto, o pastor lembra que é preciso haver um empenho daquele que tem a responsabilidade de ensinar ou ministrar, dedicação ao estudo sistemático do Texto Sagrado e uma atenção específica aos princípios da interpretação bíblica. Além disso, ressalta o líder, o pregador precisa se consagrar, orar e meditar na Palavra.

O Pr. Narciso Vanelli lembra: “Quando a Palavra é ministrada, o Espírito Santo traz a mensagem do Senhor ao coração daquele que a ouve”
Foto: Arquivo pessoal

Entendimento semelhante tem a Pra. Fabiana da Silva Gomes, líder da IIGD no Leme, zona sul do Rio de Janeiro (RJ). Para ela, tem havido muita distorção na exposição do Evangelho em algumas comunidades evangélicas, em “uma tentativa desesperada de alcançar as pessoas”. No entanto, a pastora defende que deve existir equilíbrio, uma vez que o pregador, igualmente dotado de emoções, não tem a capacidade de excluir os sentimentos de suas ministrações. “Isso nos humaniza diante do povo para quem transmitimos o sermão. E não há nenhum problema nisso”, defende. A ministra faz, entretanto, um alerta: se, por um lado, o pregador não pode excluir as emoções da ministração bíblica, por outro, não deve trazer apenas sentimentos para o púlpito. “A Palavra de Deus precisa ser entendida e transmitida de forma sóbria, e, assim, produzir uma fé eficaz nos corações”, conclui.

A Pra. Fabiana da Silva Gomes conclui: “A Palavra de Deus precisa ser entendida e transmitida de forma sóbria, e, assim, produzir uma fé eficaz nos corações”
Foto: Arquivo pessoal

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