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Concílio de Trento (1545-1563)
Foto: Wikimedia
Abraão de Almeida

O propósito da Inquisição (Parte 2): punhal da Igreja

A partir da disseminação das doutrinas reformadas por toda a Europa, inclusive na Península Ibérica, vemos o fortalecimento e a expansão da Inquisição. Contribuíram para a intensificação da ação perseguidora da Igreja Católica Romana as decisões do Concílio de Trento (1545-1563), resumidas em 12 artigos do Papa Pio IV (1499-1565). Estes, publicados em 1564, revelaram o verdadeiro espírito da contrarreforma e foram usados para justificar as perseguições.

Entre as imposições, Pio IV exigia que as pessoas abraçassem as tradições apostólicas, as constituições católicas e aceitassem que a “verdadeira” interpretação da Escritura era proveniente dos padres. O texto dizia: De igual modo, sustento que os santos, que reinam com Cristo, devem ser honrados e invocados; e que eles intercedem diante de Deus por nós, e suas relíquias devem ser tidas em veneração. […] Afirmo também que o poder das indulgências foi deixado por Cristo à igreja, e que o uso delas é muito salutar ao povo cristão. O problema é que esses artigos contrariavam abertamente as confissões da Igreja, como o Credo Niceno, profissão de fé promulgada em 325 d.C., durante o Primeiro Concílio realizado em Niceia da Bitínia, atual İznik – Turquia.

Papa Pio IV (1499-1565)
Foto: Wikimedia

Punhal da Igreja – A intolerância religiosa, que reinou livremente no catolicismo romano a partir do segundo milênio, em grande parte foi motivada pelos argumentos do teólogo italiano Tomás de Aquino (1225-1274). Segundo ele, os hereges e os corruptores da fé cristã, depois de excomungados, deveriam ser entregues ao braço secular para morrer. Dessa forma, a Inquisição, como punhal da Igreja, fez de tudo para exterminar os adeptos da Reforma e os religiosos dissidentes. Nos anais da crueldade humana, ocupam lugar de destaque as atrocidades cometidas pelos espanhóis, entre 1567 e 1573, contra os protestantes holandeses. De acordo com registros do historiador inglês Edward Gibbon (1737-1794), a quantidade de protestantes executados ultrapassou, em uma simples província, no curto reinado do célebre Duque D’Alba, agente de Filipe II, o número de mártires no espaço de três séculos, no Império Romano.

Segundo o jurista Hugo de Groot (1583-1645), o número de mártires holandeses chegou a 1 milhão. No saque de Haarlem, 300 cidadãos, atados dois a dois, foram arremessados no lago. Em Zutphen, 500 foram afogados. As barbaridades cometidas entre o saque e as ruínas de cidades esfomeadas e abrasadas vão quase além do que se pode crer: crianças eram arrancadas do ventre dos corpos vivos de suas mães; mulheres e crianças eram violadas e espatifadas pelos soldados, por todos os meios que podia descobrir a crueldade em seu engenho diabólico, registra o autor, pesquisador e diplomata norte-americano John Lothrop Motley (1814-1877), em seu livro Rise of the Dutch Republic (O nascimento da República Holandesa),publicado em 1856.

Dias nebulosos aqueles em que a Igreja Católica erguia o seu punhal inquisitorial contra todos os que não seguissem sua cartilha. Naqueles tempos, em que a intolerância reinava absoluta, os suspeitos de heresia eram arrastados aos terríveis tribunais eclesiásticos e, sem qualquer direito à defesa, torturados de maneira cruel. Desse modo, a Inquisição deteve o progresso da Reforma em vários países, como Itália, Portugal, Espanha e nas colônias portuguesas e espanholas.

Na Espanha, entre milhares de inocentes que morreram nas fogueiras ou nos cárceres, constitui-se como um dever de consciência relembrar as vítimas de, pelo menos, três conhecidos inquisidores:

– Tomás de Torquemada (1420-1498), inquisidor-geral espanhol por 18 anos, responsável por queimar 10.220 pessoas.

– Diego de Deza y Tavera (1444-1523), segundo inquisidor-geral, queimou e aplicou diversos castigos em 39.440 pessoas.

– Francisco Jiménez de Cisneros (1436-1517), cardeal e terceiro inquisidor-geral, condenou 52.852 hereges. Entre eles, 3.564 foram queimados vivos.

Calcula-se que, de 1481 a 1811, 30 mil pessoas foram incendiadas na Espanha, além de mais de 209 mil condenadas a punições quase tão cruéis quanto a morte. Desde 1520, quando uma bula papal proibiu qualquer país de aceitar os ensinamentos de Martinho Lutero (1483-1546), os seguidores do reformador alemão se transformaram em alvos da Inquisição e, consequentemente, vítimas daquele morticínio.

Em 1521, o inquisidor-geral Adriano de Utrecht (1459-1523), cardeal holandês que cumpriu a função de 1517 a 1522, ano em que se tornou papa, emitiu uma ordem para apreender todos os livros luteranos da Espanha. O grande interesse por essas obras surgiu em 1524, quando um navio procedente da Holanda, que seguia para Valência, foi capturado e levado a San Sebastian. Os escritos foram descobertos entre a carga e queimados em praça pública em seguida. Na mesma ocasião, navios venezianos que se dirigiam a Granada foram vistoriados. Neles, haviam livros luteranos, que foram apreendidos e destruídos. O capitão e os tripulantes foram presos.

Abraão de Almeida
Pastor da Igreja Evangélica Brasileira em Coconut Creek, Flórida, EUA, e autor de mais de 30 livros em português e espanhol. E-mail: abraaodealmeida7@gmail.com

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