Chaga social | Revista Graça/Show da Fé
Internacional
01/09/2020
Saudáveis Advertências – 254
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Cathy Yeulet / 123RF
Foto: Cathy Yeulet / 123RF

CHAGA SOCIAL

Atendimento à mulher vítima de violência foi ampliado no país, porém ainda há muito a ser feito

POR PATRÍCIA SCOTT

Trinta e cinco anos se passaram desde que a primeira Delegacia Especializada no Atendimento à Mulher (DEAM) foi implantada no Brasil, no bairro da Sé, na região central de São Paulo (SP). No entanto, mesmo após mais de três décadas, na maioria das cidades brasileiras (91,7%), não existe qualquer serviço policial desse tipo, de acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Ademais, em 90,3% das cidades do país não há nenhum serviço especializado no atendimento às vítimas de violência sexual. “Se a mulher não se sente segura, acaba não denunciando. Por outro lado, várias morrem mesmo estando sob medida protetiva. Sendo assim, é a inoperância do Estado um dos grandes entraves para o enfrentamento da temática, além da falta de treinamento dos agentes públicos”, avalia a advogada Adriana Passos.

Durante a pandemia do novo coronavírus, segundo dados do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, houve um aumento de 22% nos registros de casos de feminicídio. Entre abril e maio de 2020, foram 143 notificações, contra 117 no mesmo período em 2019. O número de denúncias ao Ligue 180 subiu 17,9% em março comparado ao do mesmo mês de 2019. Em abril, quando a quarentena já estava decretada em todos os estados brasileiros, foram registrados 37,6% mais casos em relação ao mesmo período do ano passado. [Leia, no final desta reportagem, o quadro Onde denunciar]

A advogada Maria Helena Campos acredita que os números de violência contra a mulher tenderão a cair após a quarentena. “A pandemia trouxe situações de convivência forçada, por extensos períodos, em um clima de estresse e insegurança.” Ela avalia que, com o término do confinamento, a vítima terá mais condições de buscar ajuda. Mas lamenta que a aplicabilidade da legislação no país deixe tanto a desejar, mesmo ela sendo “bem elaborada, atualizada e em sintonia com tratados internacionais que garantem a dignidade da pessoa humana e proteção à mulher”. Campos argumenta que, apesar dos avanços conquistados, faltam estruturas eficazes de apoio às vítimas. “Quase não existem casas de acolhimento, e as delegacias especializadas estão no início ainda. Não há preparo técnico e psicológico da força policial para tratar essas questões especificamente.”

A advogada Adriana Passos avalia: “É a inoperância do Estado um dos grandes entraves para o enfrentamento da temática”
Foto: Arquivo pessoal
A psicóloga Alessandra Augusto: “Muitas só buscam suporte e denunciam o agressor quando a situação está bastante grave”
Foto: Arquivo pessoal

Rompendo o ciclo – O Ministério da Saúde informa que, a cada quatro minutos, uma mulher é agredida por, pelo menos, um homem e sobrevive. Porém, as estatísticas oficiais não incluem as subnotificações. As vítimas sentem vergonha ou medo, por isso, explica a psicóloga Alessandra Augusto, não procuram as autoridades. “Muitas só buscam suporte e denunciam o agressor quando a situação está bastante grave”, afirma a profissional, a qual atua como voluntária do projeto Justiceiras. Essa associação com sede em São Paulo (SP) acolhe mulheres vítimas de violência e presta atendimento jurídico e psicológico. Alessandra frisa ser imprescindível dar voz e credibilidade às denunciantes, para a sociedade poder enfrentar o problema e minimizar os efeitos danosos dele.

Há 14 anos, entrou em vigor a Lei Maria da Penha, com o objetivo de coibir atos de violência doméstica. Em 2015, foi promulgada a Lei do Feminicídio, a qual estabelece penas maiores referentes a crimes cometidos em razão do gênero da vítima. Entretanto, para a advogada Anna Maria Rattes, coordenadora do Gabinete da Cidadania da Prefeitura de Petrópolis (RJ), na região serrana, as leis, por si só, não solucionam essa chaga social. “São necessárias mais campanhas de conscientização”, defende. Ela assinala que é importante capacitar profissionalmente as sobreviventes “a fim de ingressarem no mercado de trabalho e ficarem livres da dependência financeira do agressor.”

A advogada Maria Helena Campos acredita que os números de violência contra a mulher tenderão a cair após a quarentena: “A pandemia trouxe situações de convivência forçada, por extensos períodos, em um clima de estresse e insegurança”
Foto: Arquivo pessoal

Tudo novo – Quando a vítima não tem renda própria, a tendência é ela permanecer no relacionamento abusivo. Foi isso o que aconteceu com a dona de casa K., 51 anos, a qual falou com a reportagem de Graça/Show da Fé sob a condição de não ser identificada. Por uma década, ela se submeteu a contínuas agressões físicas e verbais. “Aceitava por causa dos meus filhos. Achava que eles precisavam do pai, mesmo vivendo em um ambiente nocivo.”

No entanto, quando os maus-tratos foram estendidos aos filhos, a dona de casa pôs um ponto final no casamento. “Tomei coragem e denunciei. A Justiça determinou que ele se mantenha afastado de mim, e os meus filhos não querem contato com o pai.” Ela diz que, como cristã, perdoou o ex-companheiro e deixou aqueles eventos no passado, pois encontrou, em Jesus, a restauração emocional, psicológica e espiritual. “O Senhor restabeleceu a minha vida. Tudo se fez novo”, testemunha ela, obreira da Igreja Internacional da Graça de Deus (IIGD).

Casada há 21 anos, a também dona de casa C., 37, foi vítima de agressões físicas por mais de dez anos e relata que ficou inúmeras vezes com os olhosarroxeados. “Em diversas ocasiões, pedi ajuda, mas as pessoas ficavam contra mim e a favor dele, porque eu usava drogas na época.” C. chegou a denunciar o marido, entretanto manteve o vínculo matrimonial. “Pensava nos meus filhos. Não desejava a destruição da minha família.” Ela só decidiu pela separação quando o esposo caiu em adultério, porém, em seguida, C. mudou de ideia. “Reatamos, conheci Jesus e fui orientada como proceder.” Após a conversão ao Evangelho, destaca ela, que hoje é membro da IIGD, as brigas e as agressões cessaram.

Para a advogada Anna Maria Rattes, as leis, por si só, não resolvem essa chaga social: “São necessárias mais campanhas de conscientização”
Foto: Geraldo Magela / Agência Senado

Oração e aconselhamento – No enfrentamento à violência contra a mulher, a Igreja tem um papel fundamental. O Pr. João Pedro Magalhães, auxiliar da IIGD na Freguesia, zona oeste do Rio de Janeiro (RJ), aponta que, em várias congregações, há mulheres que são atacadas constantemente pelo cônjuge. “Recebemos essas vítimas, que sentem vergonha de expor a situação até para seus familiares. Devemos ensinar o correto, pois a violência vai contra a Palavra de Deus”, ressalta o pastor, lembrando as palavras do apóstolo Paulo registradas em Efésios 5.25: Vós, maridos, amai vossa mulher, como também Cristo amou a igreja e a si mesmo se entregou por ela. “O marido deve honrar sua mulher, e não a enxergar como uma figura que supre as suas necessidades”, salienta Magalhães. Há homens, acentua ele, que não entenderam o papel deles na família.

Pr. João Pedro Magalhães: “Recebemos essas vítimas, que sentem vergonha de expor a situação até para seus familiares. Devemos ensinar o correto, pois a violência vai contra a Palavra de Deus”
Foto: Arquivo pessoal

A Pra. Silvana Veiga, da IIGD em Piabetá, em Magé (RJ), endossa a importância de a Igreja auxiliar vítimas de abuso. Na opinião dela, é essencial prestar toda a ajuda espiritual, com oração e aconselhamento. Contudo, Veiga acha que a liderança deve ouvir todos os envolvidos com o intuito de entender a raiz das agressões. “Assim, será possível orientar o casal. Nem tudo é espiritual. Existem questões em que será indispensável a intervenção de especialistas, como médicos e psicólogos.”

A pastora ressalta que o diabo utiliza brechas, como entorpecentes e bebidas, para agir. No entanto, outros gatilhos podem estar sendo acionados. “Há homens que cresceram em lares desestruturados e estão reproduzindo o que vivenciaram”, comenta a líder, sinalizando que, independentemente da motivação do agressor, a vítima precisa buscar auxílio. “A mulher não pode aceitar ser agredida, ela sendo cristã ou não. O ciclo de violência deve ser rompido”, conclui.

Onde denunciar

Por telefone:
190 – Polícia Militar
100 – Disque Direitos Humanos
180 – Central de Atendimento à Mulher

Por aplicativo de smartphone:
Clique 180 – Um aplicativo desenvolvido para o sistema Android (da empresa Google) que mostra informações sobre violência doméstica, abuso sexual e a Lei Maria da Penha. Além disso, no app, há um link direto para a Central de Atendimento à Mulher.

Pessoalmente:
Delegacias de Polícia Civil
Delegacias Especializadas no Atendimento à
Mulher (DEAM)
Defensoria Pública

(Patrícia Scott, com informações da web)


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