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Foto: belchonock / 123RF

Mais protegidos?

Nova lei pretende punir com maior rigor quem praticar violência contra crianças e adolescentes menores de 14 anos

Por Evandro Teixeira

A Presidência da República sancionou, no primeiro semestre deste ano, a Lei 14.344/2022, que torna crime hediondo o homicídio praticado contra menores de 14 anos. A nova norma foi batizada de Lei Henry Borel, em homenagem ao menino de quatro anos morto após espancamento na residência onde morava com mãe e o padrasto, no Rio de Janeiro (RJ), em 2021. A lei também estabelece medidas protetivas específicas para crianças e adolescentes vítimas de violência doméstica e familiar. [Leia, no final desta reportagem, o quadro Novas regras]

O educador e psicopedagogo Raimundo Nonato Patrício Gomes defende: “Se a criança cresce em um lar pouco estruturado, sua vulnerabilidade tende a aumentar. Por causa disso, é preciso desenvolver uma política de conscientização dos familiares sobre a necessidade de garantir a proteção desses menores”
Foto: Arquivo pessoal

O caso de Henry está longe de ser um problema isolado. Segundo dados do Disque 100 – serviço de ouvidoria ligado ao Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos –, somente em 2021 foram feitas mais de 50 mil denúncias de violência praticada contra crianças e adolescentes. Desse total, 81% dos abusos ocorreram dentro da casa da vítima. No mesmo período, em 2020, ano em que muitas famílias ficaram confinadas em casa devido à pandemia da covid-19, houve 53.533 denúncias. Os dados confirmam que os menores correm maior risco nas mãos daqueles que, pelas leis humanas, deveriam garantir-lhes proteção. As mães aparecem como as principais violadoras, com 15.285 denúncias, seguidas dos pais (5.861 registros), padrastos ou madrastas (2.664) e outros familiares (1.636).

O educador e psicopedagogo Raimundo Nonato Patrício Gomes alerta que apenas a criação de leis – como o próprio Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), o qual já está em vigor há 32 anos – não é suficiente para minimizar o problema da violência. “Se a criança cresce em um lar pouco estruturado, sua vulnerabilidade tende a aumentar. Por causa disso, é preciso desenvolver uma política de conscientização dos familiares sobre a necessidade de garantir a proteção desses menores”, defende Gomes, que dirige a Casa do Mestre, um centro de ação social para crianças situado na Praça Seca, zona oeste do Rio de Janeiro (RJ).

A assistente social Leila Ramos Ferreira lembra: “Existe ainda a sombra da impunidade no Brasil, pois, mesmo havendo denúncias, nem todas são devidamente investigadas”
Foto: Arquivo pessoal

O especialista acredita que a Lei Henry Borel é um progresso, já que esse tipo de violência tende a ser tratado com maior rigor. No entanto, aproveita a oportunidade de falar com Graça/Show da Fé para deixar um recado: “Avançamos, mas precisamos avançar ainda mais. É preciso atentar também para os possíveis traumas gerados nas vítimas”. Ele lembra que o Brasil é deficiente na oferta de serviços públicos de saúde mental para crianças e adolescentes, especialmente as vítimas de abusos. “Ao buscar apoio dos conselhos tutelares, os menores dificilmente encontram um tratamento especializado gratuito”, lamenta-se.

Fator justificável – Outro problema relacionado à violência doméstica contra crianças e adolescentes é apontado pela assistente social Leila Ramos Ferreira: a subnotificação. De acordo com ela, por mais que órgãos oficiais se esforcem para registrar e punir aqueles que praticam abusos contra menores, nem todos chegam ao conhecimento das autoridades e, obviamente, não ganham a notoriedade da história do menino Henry Borel.

O psicólogo e psicanalista José dos Santos Oliveira diz que denunciar possíveis violações é muito importante: “Passam a demonstrar tristeza, choram sem motivo aparente, não dormem bem e perdem o apetite”
Foto: Arquivo pessoal

Apesar de comemorar a criação de mais uma lei que visa proteger crianças e adolescentes, Leila Ferreira reconhece que esses dispositivos legais, sozinhos, não atingirão os efeitos esperados pela sociedade. “Existe ainda a sombra da impunidade no Brasil, pois, mesmo havendo denúncias, nem todas são devidamente investigadas.”

Outra questão levantada pelos especialistas é a ideia (equivocada) de que a violência física é uma forma eficiente de educar os pequenos. Os estudiosos do assunto lembram que os abusadores apontam como justificativas para seus atos violentos coisas triviais, como o choro da criança ou alguma situação que tenha irritado muito o agressor – ele sendo membro da família ou não. Para o psicólogo e psicanalista José dos Santos Oliveira, denunciar possíveis violações é muito importante. Nesse sentido, vizinhos e familiares podem e devem ficar atentos aos sinais dados pelos menores, uma vez que estes tendem a mudar de comportamento quando algo está errado. “Passam a demonstrar tristeza, choram sem motivo aparente, não dormem bem e perdem o apetite”, enumera. 

A psicóloga Priscila Gomes Chaves Pereira lembra que os atos violentos criam um ciclo difícil de ser quebrado, pois a criança assimila que é apenas por meio de ações hostis que conseguirá atingir seus objetivos
Foto: Arquivo pessoal

A psicóloga Priscila Gomes Chaves Pereira lembra que a agressão – física, psicológica, sexual ou moral – deixa marcas profundas no indivíduo. De acordo com a especialista, os atos violentos criam um ciclo difícil de ser quebrado, pois a criança assimila que é apenas por meio de ações hostis que conseguirá atingir seus objetivos. “Esse comportamento tende a ser passado para as gerações futuras: a chamada cultura da violência.” Segundo ela, para quebrar esse ciclo de agressividade, é essencial que a criança ou o adolescente tenha, de fato, a ajuda de um especialista que o faça ressignificar essas tristes experiências e, assim, consiga superar o problema e suas consequências. “É imprescindível que a família esteja envolvida nesse processo.”

Para a diarista Luciene Lisboa Carvalho, 27 anos, mãe de dois filhos de cinco e dois anos, praticar qualquer tipo de violência contra eles é algo impensável. Membro da sede regional da Igreja Internacional da Graça de Deus (IIGD) em Governador Valadares (MG) e casada com o atendente de telemarketing Muller de Souza Carvalho, 33 anos, ela entende que a violência doméstica contra crianças evidencia o quanto a humanidade está distante de Deus. Luciene lembra que esse comportamento criminoso tem relação direta com o pecado original, no Jardim do Éden, quando Adão deixou de dar ouvidos à orientação divina (Gn 3). Em sua opinião, meninos e meninas devem ser disciplinados com amor, na medida e no momento certos. A diarista aconselha os pais a permanecer vigilantes. “Como servos de Deus, temos de fechar as brechas, a fim de evitar cometer graves erros”, alerta.

A diarista Luciene Lisboa Carvalho, com o marido, Muller, e os filhos, diz que praticar qualquer tipo de violência contra eles é algo impensável: “Como servos de Deus, temos de fechar as brechas, a fim de evitar cometer graves erros”
Foto: Arquivo pessoal

“Corrigir e agredir” – O Pr. Flaviano Nogueira Gomes, líder regional da IIGD em Patos de Minas (MG), considera que qualquer agressão é uma escolha, como no caso do assassinato de Abel (Gn 4.8). O pregador observa que Deus havia alertado o assassino, Caim, irmão da vítima, sobre o desejo reprovável que estava em seu coração. “Diz o texto: E o Senhor disse a Caim: Por que te iraste? E por que descaiu o teu semblante? Se bem fizeres, não haverá aceitação para ti? E, se não fizeres bem, o pecado jaz à porta, e para ti será o seu desejo, e sobre ele dominarás (Gn 4.6,7). Ele não quis ouvir o Senhor. Em diferentes situações na vida, as pessoas têm a oportunidade de tomar decisões diante de circunstâncias, que, às vezes, envolvem muita carga emocional.”

O Pr. Flaviano Nogueira Gomes considera que qualquer agressão é uma escolha: “Em diferentes situações na vida, as pessoas têm a oportunidade de tomar decisões diante de circunstâncias, que, às vezes, envolvem muita carga emocional”
Foto: Arquivo pessoal

Na opinião do líder, a Igreja deve sempre assumir seu papel de orientadora, procurando zelar pela fiel aplicação da Palavra, mas, também, buscando analisar, com bastante cuidado, caso a caso. “A ajuda [eclesiástica] dependerá da extensão e gravidade do problema. Em algumas situações, pode ser necessário, inclusive, procurar um suporte jurídico”, pondera.

O Pr. Carlos Alexandre Pontes da Silva, ao lado da esposa, Carla, define: “Os pais que ensinarem seus filhos irão conseguir um bom retorno. Além disso, aprenderão a diferença entre corrigir e agredir”
Foto: Arquivo pessoal

Esse também é o pensamento do Pr. Carlos Alexandre Pontes da Silva, auxiliar na sede estadual da Igreja da Graça em Manaus (AM). Para ele, a Igreja deve dar aconselhamentos sobre como os pais podem corrigir seus filhos, e também reforçar, dos púlpitos, a necessidade de a família ensiná-los com base em Provérbios 22.6 (Instrui o menino no caminho em que deve andar, e, até quando envelhecer, não se desviará dele). “Os pais que ensinarem seus filhos irão conseguir um bom retorno. Além disso, aprenderão a diferença entre corrigir e agredir.”

Novas regras

De acordo com a Lei Henry Borel, que altera o Código Penal Brasileiro, o homicídio praticado contra menor de 14 anos passa a ser considerado crime hediondo, inafiançável e insuscetível de anistia, graça e indulto. O condenado é obrigado a cumprir pena em regime inicial fechado, não sendo possível a conversão da punição em cesta básica ou multa. A sanção prevista na lei varia de 12 a 30 anos de reclusão, podendo ser aumentada de um terço até a metade, se a vítima for pessoa com deficiência ou se tiver doença que implique o aumento de sua vulnerabilidade.

A lei estabelece ainda medidas protetivas para menores vítimas de violência doméstica e familiar. Se houver risco à vida ou à integridade física da vítima, o agressor deve ser afastado do local de convivência. Em caso de prisão do agressor, é vedada a concessão de liberdade provisória. O descumprimento das medidas protetivas pode resultar em pena de detenção de três meses a dois anos. (Fonte: Agência Senado)


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