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Jornal das Boas-Novas – 290
25/09/2023
Falando de História – 290
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Foto: Arquivo Graça / Marcelo Nejm

Pregação sólida

Pastores e especialistas discutem o cenário religioso nacional e o crescimento das igrejas evangélicas no país

Por Evandro Teixeira

Em alguns países, especialmente os europeus, a fé em Jesus está em declínio. Na contramão dessa tendência, o Brasil continua sendo majoritariamente cristão, e o cristianismo cresce a passos largos, segundo diversos levantamentos. Um dos mais recentes, intitulado Religião Global 2023, realizado em 26 países pelo instituto de pesquisas Ipsos, mostra que 70% dos brasileiros se identificam como cristãos – católicos, evangélicos e outros. Em contrapartida, na Inglaterra, nação “exportadora” de missionários em séculos anteriores, apenas 46,2% da população se diz cristã, de acordo com o último censo, divulgado no final de 2022. Em 2011, esse percentual era de 59,3%.

O demógrafo José Eustáquio Diniz Alves, professor aposentado da Escola Nacional de Ciências Estatísticas (ENCE) do IBGE, estimou, em 2020, que, a partir de 2032, o número de evangélicos ultrapassaria o de católicos no Brasil – Foto:
Divulgação / Sunderlan Jeda

No Brasil, a fé cristã está em alta, mas tem mudado de configuração. Embora os dados oficiais sobre filiação religiosa do Censo 2022 ainda não tenham sido divulgados pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), projeções indicam uma tendência de aumento no número de evangélicos e um declínio na quantidade de católicos. Estimativas apresentadas em 2020 pelo demógrafo José Eustáquio Diniz Alves, professor aposentado da Escola Nacional de Ciências Estatísticas (ENCE) do IBGE, apontavam que o número de fiéis de denominações protestantes ultrapassaria o total de católicos no país a partir de 2032. 

O cientista político Victor Araújo, do Centro de Estudos da Metrópole (CEM) da USP, confirma a tendência de crescimento vertiginoso dos evangélicos no país – Foto:
Divulgação / CPDOC-FGV

O cientista político Victor Araújo, do Centro de Estudos da Metrópole (CEM) da Universidade de São Paulo (USP), confirma essa tendência. Segundo um estudo que levou em conta dados da Receita Federal, somente em 2019 (último ano analisado na pesquisa) foram abertos, diariamente, 17 novos templos no país. Em reportagem produzida pela Agência FAPESP, Araújo revelou que os cinco estados com maior número de igrejas evangélicas por cem mil habitantes eram: Espírito Santo, Rio de Janeiro, Mato Grosso do Sul, Rondônia e São Paulo. Não por coincidência, essas são as unidades federativas mais próximas de completar a transição religiosa, quando nenhum outro segmento religioso será maior do que o grupo composto pelos evangélicos, aponta o relatório do levantamento. [Leia, no final desta reportagem, o quadro Crescimento vertiginoso

A cientista social Rosângela Paes Romanoel assevera que o avanço do protestantismo no Brasil está ligado ao avivamento evangélico e ao crescimento da mídia cristã – Foto: Arquivo pessoal

São muitas as razões que explicam o aumento do número de evangélicos, mas, de acordo com a cientista social Rosângela Paes Romanoel, a primeira é histórica. Ela recorda que o processo de cristianização nacional teve início durante o período colonial, quando os primeiros missionários jesuítas chegaram ao território brasileiro dispostos a evangelizar os indígenas. Quatro séculos depois, com o despertamento missionário das igrejas protestantes nos Estados Unidos e na Europa, na virada do século 19 para o 20, teve início uma mudança no quadro religioso nacional, especialmente nas áreas mais pobres. A especialista e membro da Assembleia de Deus em Uberaba (MG) exalta o papel fundamental dos crentes em Jesus ao longo da história, para o Brasil se tornar “um país majoritariamente cristão” e assevera que o avanço do protestantismo aqui está ligado ao avivamento evangélico e ao crescimento da mídia cristã. “A globalização das comunicações fez um número maior de pessoas se interessarem por conhecer mais a Palavra.”

A teóloga Glair Alonso Arruda afirma: “Evangelizar é caminhar junto e transmitir a vida de Jesus. Trata–se de uma ação motivada pelo coração e envolve relacionamentos pessoais” – Foto: Arquivo pessoal

Pela fé – Isso se reflete em outro dado interessante da pesquisa do instituto Ipsos: independentemente da filiação religiosa, 89% dos respondentes declararam acreditar no Altíssimo. Entretanto, quem estuda o assunto lembra que o alto índice de crentes no Senhor não significa dizer que esses são fruto de um processo de conversão. A fé desses indivíduos pode ser, na verdade, resultado de uma cultura cristianizada, que prevalece desde os tempos coloniais. Para a teóloga Glair Alonso Arruda, doutora em Ciência da Religião e membro da Igreja Batista de Água Branca, na zona oeste de São Paulo (SP), a Igreja de Cristo deve continuar avançando para além dessas fronteiras culturais, praticando uma evangelização que vá além da pregação de doutrinas e regras. “Evangelizar é caminhar junto e transmitir a vida de Jesus. Trata-se de uma ação motivada pelo coração e envolve relacionamentos pessoais”, afirma. 

O Pr. Nilson Anízio Silva alerta: “Cada um precisa ver se há em si mesmo algum caminho mal. Devemos nos realinhar com Deus por meio do arrependimento, da oração e do retorno às Escrituras” – Foto: Arquivo pessoal

O Pr. Nilson Anízio Silva, da Igreja Batista de Aracuí, em Castelo (ES), concorda com as pesquisas citadas no início desta reportagem, as quais apontam para um crescimento evangélico no Brasil. No entanto, questiona se os números refletem, de fato, uma mudança por meio da fé em Cristo ou se são apenas discursos vazios desses indivíduos. “Cada um precisa ver se há em si mesmo algum caminho mal. Devemos nos realinhar com Deus por meio do arrependimento, da oração e do retorno às Escrituras.”

O Pr. Elton Eduardo Paz de Araújo lembra que integrar ativamente uma comunidade de fé significa abraçar a oportunidade de conviver e crescer com outros servos de Deus: “A casa do Senhor é o local para aprender sobre a Bíblia e seus ensinamentos” – Foto: Arquivo pessoal

Por sua vez, o Pr. Elton Eduardo Paz de Araújo, líder regional da Igreja Internacional da Graça de Deus (IIGD) em Tancredo Neves (AM), assevera que fazer parte de uma igreja vai muito além de estatísticas. De acordo com o ministro do Evangelho, integrar ativamente uma comunidade de fé significa abraçar a oportunidade de conviver e crescer com outros servos de Deus. “A casa do Senhor é o local para aprender sobre a Bíblia e seus ensinamentos”, pontua, lembrando que o amor deve ser a base de toda atividade das congregações. “Somente por meio dele, as igrejas podem promover ações evangelísticas e de caráter social, a fim de se aproximarem da comunidade ao redor e perceber as verdadeiras carências dela.”

O Pr. André Miranda Soares Abreu destaca que os membros das comunidades cristãs precisam estar fortalecidos para promover um crescimento quantitativo saudável – Foto: Arquivo pessoal

Dentro dessa mesma perspectiva, o Pr. André Miranda Soares Abreu, da Igreja Batista no bairro Capelinha, em Itaperuna (RJ), destaca que os membros das comunidades cristãs precisam estar fortalecidos para promover um crescimento quantitativo saudável. Segundo ele, um dos caminhos para alcançar esse objetivo é manter a comunhão com pequenos grupos. “Assim, é possível dar mais atenção às pessoas de forma individualizada e acompanhar a caminhada cristã delas mais de perto.”

O Pr. Marcos Paulo Feltrin afirma: “Congregar é uma ordem bíblica para os filhos de Deus” – Foto: Arquivo pessoal

O Pr. Marcos Paulo Feltrin, líder da IIGD em São Caetano do Sul (SP), enfatiza a importância de o cristão se envolver nas atividades promovidas pela congregação da qual faz parte a fim de alimentar a fé no Senhor. “Congregar é uma ordem bíblica para os filhos de Deus”, afirma Feltrin, citando Romanos 12.4,5: Porque assim como em um corpo temos muitos membros, e nem todos os membros têm a mesma operação, assim nós, que somos muitos, somos um só corpo em Cristo, mas individualmente somos membros uns dos outros. Segundo o ministro, para que a obra de Cristo se reflita nas estatísticas nacionais, é fundamental haver uma pregação sólida com base exclusivamente bíblica. “Caso contrário, mesmo com o número de evangélicos aumentando, o que é aparentemente positivo, continuaremos a ver o pecado se perpetuando no país”, conclui.

Crescimento vertiginoso

Foto: Arquivo Graça / Solmar Garcia

Divulgada neste ano, a pesquisa Surgimento, Trajetória e Expansão das Igrejas Evangélicas no Território Brasileiro ao Longo do Último Século(1920-2019), realizada pelo Centro de Estudos da Metrópole (CEM) da USP com base em dados do Cadastro Nacional da Pessoa Jurídica (CNPJ) fornecidos pela Receita Federal, comprova o crescimento do número de comunidades protestantes no país. O estudo mostra que nem todas as igrejas brasileiras, abertas no passado ou no tempo presente, são devidamente registradas, mas, por meio do inquérito, é possível verificar as provas desse avanço.

De acordo com o levantamento, a Primeira Igreja Batista de Nova Iguaçu (RJ), fundada em 24 de setembro de 1922, embora não tenha sido a primeira congregação evangélica a ser inaugurada no país, foi a pioneira na realização do cadastro no Brasil, o qual segue ativo até hoje. Os pesquisadores da USP descobriram também que em 1960 existiam oficialmente apenas 18 igrejas evangélicas classificadas como missionárias (batista, presbiteriana, congregacional, metodista). Não entraram nessa contagem as muitas congregações abertas em todos os rincões nacionais e que funcionavam na informalidade. 

Outro dado interessante da pesquisa refere-se ao período de 1960 a 1980, no qual o número de igrejas crentes missionárias registradas na Receita Federal cresceu mais de 170 vezes, atingindo a marca de 3.087. De 1981 a 2000, a expansão continuou, mas foi a partir de 2000 que ocorreu um crescimento exponencial. Em 2019, ano mais recente avaliado no estudo, o Brasil registrava 109.560 congregações evangélicas das mais diversas denominações, presentes em todos os estados da federação e no Distrito Federal (DF), e uma média de 17 novos templos abertos diariamente. (Colaborou Élidi Miranda)

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