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Sociedade
08/08/2022
Heróis da Fé | Paul W. Brand
01/09/2022
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Heróis da Fé | Paul W. Brand
01/09/2022
Foto: Arquivo Graça / Rodrigo Di Castro

Por todo o mundo

A fé cristã está entre as que mais crescem no planeta, principalmente em países da África e da América Latina

Por Ana Cleide Pacheco

No final do século 19, quando o filósofo Friedrich Nietzsche (1844-1900) declarou que Deus estava morto, jamais imaginaria que, em pleno século 21, o mundo estaria cada vez mais religioso. E o pensador alemão nem sequer poderia cogitar que a fé cristã estaria em alta, angariando cada dia mais adeptos, como mostra a última edição do levantamento Status do Cristianismo Global, realizada anualmente por pesquisadores do Seminário Teológico Gordon-Conwell, na cidade de Hamilton (Massachusetts), um dos mais respeitados dos Estados Unidos.

De acordo com a pesquisa, nenhuma outra religião tem experimentado um aumento do número de fiéis tão grande como o cristianismo (1,17%), uma taxa de crescimento pouco inferior ao da população mundial, algo em torno de 1,27%. Em números absolutos, significa dizer que, até o final de 2022, o mundo contará com quase 2,6 bilhões de cristãos (quase um terço da população global, de 7,96 bilhões de pessoas) e, por volta de 2050, chegará a 3,3 bilhões. Hoje, os católicos ainda representam o maior segmento cristão do planeta – com 1,26 bilhão de fiéis –, mas os grupos que mais ascendem são os pentecostais (1,88% ao ano) e os evangélicos tradicionais (1,8%).

Voz do engano: o filósofo Friedrich Nietzsche (1844-1900), o qual declarou, no final do século 19, que Deus estava morto
Foto: Wikimedia

E, novamente contrariando Nietzsche, o estudo de Gordon-Conwell mostrou que o número dos chamados “sem religião”, ou que preferem não se identificar com qualquer conjunto formal de crenças, tem subido bem menos: 0,52% ao ano. Os ateus também estão em baixa, com um crescimento em torno de 0,18%. De acordo com o levantamento, o número de descrentes está em queda no planeta: atualmente há menos ateus (147 milhões) do que havia em 1970 (165 milhões). Os pesquisadores acreditam que esse número de descrentes será ainda menor por volta de 2050. 

Para o teólogo e pastor Luciano Cozendey dos Santos, 44 anos, líder da Primeira Igreja Batista em Rio Bonito (RJ), os números da análise foram, provavelmente, impulsionados pelo momento histórico atual e seriam um reflexo da pandemia do novo coronavírus. “Crises psicossociais, existenciais e familiares têm alcançado níveis jamais vistos no mundo, e a fragilidade humana está sendo exposta claramente”, analisa o pregador, assinalando que as pessoas estão em busca de algum alívio para as suas dores e de respostas para as suas dúvidas. Conforme o líder ressalta, um número considerável desses indivíduos está buscando essas respostas no Senhor. “Espero que, além de respostas, encontrem o próprio Deus que não deixa ninguém confuso.”

O teólogo e pastor Luciano Cozendey dos Santos analisa: “Crises psicossociais, existenciais e familiares têm alcançado níveis jamais vistos no mundo, e a fragilidade humana está sendo exposta claramente”
Foto: Arquivo pessoal

Crescimento quantitativo – O Pr. José Sandoval Bezerra, 54 anos, líder da Igreja Metodista Wesleyana na Taquara, zona oeste do Rio de Janeiro (RJ), compartilha opinião semelhante à de Luciano dos Santos. “Não possuo todos os dados dessa pesquisa, mas concordo que tem ocorrido um despertar religioso no mundo”, atesta. Bezerra frisa que, historicamente, diante de qualquer epidemia fatal, aumenta a procura pelos templos religiosos. “Por isso, acredito que, devido à ‘proximidade’ da morte, muitos tenham procurado se achegar às religiões”, opina.

Contudo, ao ser indagado sobre o aumento do número de cristãos e da redução da quantidade de ateus e de pessoas sem religião, Bezerra declarou, enfaticamente, que o cristianismo oferece às pessoas algo muito mais atraente. “É natural do ser humano se apegar a uma esperança. O ateísmo não tem isso”. No entanto, o líder aproveitou a oportunidade para lembrar que, embora haja um imenso crescimento quantitativo da Igreja no Brasil, não se verifica um grande envolvimento dos missionários brasileiros na evangelização mundial. “Do mesmo modo que norte-americanos e europeus investiram em nossa evangelização, Deus espera essa atitude de nossas igrejas a fim de outras nações serem alcançadas pelo Evangelho”, conclama.

O Pr. José Sandoval Bezerra atesta: “Não possuo todos os dados dessa pesquisa, mas concordo que tem ocorrido um despertar religioso no mundo”
Foto: Arquivo pessoal

O Pr. César Moisés Carvalho, membro da Assembleia de Deus do Rio de Janeiro, em Benfica, zona norte carioca, foi ainda mais crítico que Sandoval Bezerra. Para ele, a pouca participação de missionários brasileiros na evangelização mundial se deve ao fato de que nosso país estaria experimentando um crescimento meramente quantitativo da Igreja. Carvalho pensa que o simples aumento do número de adeptos da fé cristã deve ser visto com ressalvas. “Estamos, do ponto de vista do discipulado, qualitativamente muito mal.”

Cedo para projeções – A elevação do número de cristãos no mundo, obviamente, não acontece de forma igualitária. “Percebemos que o cristianismo está crescendo muito na América Latina, na África e em parte da Ásia, porém está caindo bastante nos Estados Unidos e quase desapareceu na Europa”, afirma o sociólogo Andrew Johnson, 44 anos.

De fato, de acordo com a pesquisa norte-americana, em 1900, a Europa reunia o dobro dos cristãos que viviam no resto do mundo. Mais de cem anos depois, o cenário é totalmente diferente: hoje, a África concentra o maior contingente de crentes em Jesus de todo o planeta, e a taxa de crescimento do cristianismo no continente africano gira em torno de 2,77% ao ano. Por volta de 2050, estima-se que a África terá mais de 1,3 bilhão de crentes em Cristo, muito mais que a Europa (497 milhões) e a América do Norte (276 milhões).

O Pr. César Moisés Carvalho pensa que o simples aumento do número de adeptos da fé cristã deve ser visto com ressalvas, e faz um alerta: “Estamos, do ponto de vista do discipulado, qualitativamente muito mal”
Foto: Arquivo pessoal

No entanto, o sociólogo acredita que ainda é (muito) cedo para fazer quaisquer projeções. Ele explica que o advento da internet, o secularismo e o individualismo podem representar desafios complexos, o que dificulta esse tipo de calculo futuro. “Sem contar que as tecnologias mudam o tempo todo, influenciando a maneira com que os indivíduos se relacionam com a religião também. Há dois anos, frente ao que vivenciamos, vimos o quão difícil é fazer qualquer projeção”, afirma Johnson, membro da Restoration Anglican Church em Minneapolis, no estado de Minnesota (EUA).

Cinturões de resistência – Existe ainda outro desafio para o crescimento da fé cristã no mundo: alguns países nos quais outras religiões são majoritárias formam verdadeiros cinturões de resistência. É o que explica, por exemplo, as taxas de ascensão do cristianismo menores nas nações islâmicas (1,93%) e na Índia (1,21%), onde prevalece a religião hindu. Essa baixa aceitação da Palavra de Deus se dá por vários motivos, de acordo com o Pr. Edson Tinoco da Costa, 68 anos, da Igreja Batista Ministério Sal e Luz, em Bento Ribeiro, zona norte do Rio de Janeiro (RJ). Ele lembra que tanto o hinduísmo quanto o islamismo são religiões extremamente conservadoras nos costumes. E, na contramão disso, o cristianismo tem se mostrado cada vez mais tolerante. “É possível que a rejeição à pregação do Evangelho, nesses países, seja motivada pelo liberalismo cristão”, opina Costa, líder da Rede Missionária Sal e Luz, na Vila Militar, zona oeste carioca.

O sociólogo Andrew Johnson observa que a elevação do número de cristãos no mundo, obviamente, não acontece de forma igualitária: “Percebemos que o cristianismo está crescendo muito na América Latina, na África e em parte da Ásia, porém está caindo bastante nos Estados Unidos e quase desapareceu na Europa”
Foto: Arquivo pessoal

Porém, o doutor em História Lucas Gesta, 32 anos, aponta outras razões para a baixa adesão ao cristianismo nas nações onde prevalece o islamismo e o hinduísmo. “As estratégias de crescimento do islã são diferentes do cristianismo, pois passam por alguns estágios”, explica. Ele destaca que um deles é a multiplicação de filhos. Esse fenômeno pode ser observado hoje na Europa, onde o número de filiados ao islamismo aumenta à medida que cresce a densidade populacional dos que se identificam como muçulmanos. “Há ainda a adoção e sustento de crianças pobres, bem como o casamento de meninas órfãs e pobres com muçulmanos – e sua conversão à religião.”

Para ele, o mesmo fenômeno ocorre no hinduísmo: o número de adeptos aumenta na mesma proporção da população da Índia, o segundo país mais populoso do mundo (1,3 bilhão de habitantes), que concentra o maior número de adeptos dessa religião. “O hinduísmo cresce a partir do próprio desenvolvimento populacional [0,6% por ano], já que é uma religião obrigatoriamente étnica”, destaca Gesta, especialista em História da Igreja e membro da Igreja Batista Local, na Vila da Penha, zona norte do Rio de Janeiro (RJ).

O Pr. Edson Tinoco da Costa acredita que a baixa aceitação da Palavra de Deus em algumas nações resida no fato de o cristianismo se mostrar cada vez mais tolerante: “É possível que a rejeição à pregação do Evangelho, nesses países, seja motivada pelo liberalismo cristão”
Foto: Arquivo pessoal

Lucas Gesta acrescenta que nem sempre é possível saber o número exato de cristãos em alguns países. De acordo com ele, na Índia, por exemplo, existem regiões em que boa parte da população se identifica como cristã, como em Kerala (no Sul do país) e Nagaland (no extremo Leste). “O maior empecilho ao crescimento do cristianismo global, na atualidade, é o enfraquecimento das juntas missionárias ocidentais, mais até do que a realidade [desafiadora] desses países.”

O doutor em História Lucas Gesta assinala: “O maior empecilho ao crescimento do cristianismo global, na atualidade, é o enfraquecimento das juntas missionárias ocidentais”
Foto: Arquivo pessoal

Contudo, apesar de tantas barreiras à pregação da Palavra e da dificuldade de serem feitas projeções futuras confiáveis, o sociólogo Andrew Johnson entende que o Brasil e a América Latina têm um papel de extrema importância no cenário da evangelização mundial. “Temos um número bastante expressivo de cristãos e igrejas fortes que tem crescido bastante. Assim, é necessário que os pastores dessas nações comecem a pensar em como liderar de forma global”, conclama Johnson, o qual acredita firmemente que o futuro da Igreja está nas mãos dos cristãos que habitam o Hemisfério Sul, em especial na África e na América Latina, onde o Brasil desempenha um papel fundamental. “A Igreja brasileira será uma das mais importantes nos próximos 30 ou 50 anos. E, creio, viveremos um grande avivamento mundial”, conclui.


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