Entrevista | Revista Graça/Show da Fé
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Foto: Arquivo pessoal

“Oxigênio” para a Igreja

Pesquisador analisa o crescimento da juventude nas comunidades evangélicas do Brasil nos próximos anos

Por Patrícia Scott

A mocidade representa o presente e o futuro da Igreja. Isso porque ela constitui maioria nas comunidades de fé e é a futura liderança, que pode contribuir hoje para as mudanças que ocorrerão amanhã.” Esse é o parecer do pastor, teólogo e pesquisador Rodolfo Capler, 36 anos, líder da Igreja Batista Alternativa em Piracicaba (SP) e pesquisador do Laboratório de Política, Comportamento e Mídia da Fundação São Paulo da Pontifícia Universidade Católica (PUC-SP). Um dos frutos do seu trabalho de campo é o livro Geração selfie: conheça a geração digital e seus principais comportamentos (editora Quitanda), no qual traça o perfil dos nativos digitais. Na obra, o pesquisador mostra como esses jovens enxergam diversas questões à sua volta, como sexualidade e religião.

Ao ser indagado sobre os motivos que têm levado muitos deles a abraçarem a fé evangélica, o especialista destaca que a ênfase no indivíduo – pregada em diversos púlpitos país afora – cativa boa parte dos cristãos nessa faixa etária. Segundo Capler, paralelamente a juventude também se associa às igrejas evangélicas em função da música gospel, que abarca os mais variados subgêneros populares, e por causa da presença maciça das congregações em áreas de vulnerabilidade social.

Nesta entrevista à Graça/Show da Fé, Capler fala sobre o que tem observado em suas pesquisas a respeito da presença crescente dos jovens nas igrejas evangélicas e de que forma as comunidades de fé abraçam moços e moças.

Existe a tendência de as igrejas evangélicas terem mais jovens do que adultos nos próximos anos. Quais são as razões para esse fenômeno?

O catolicismo é bastante popular entre pessoas com 40 anos de idade ou mais, e os evangélicos pentecostais atraem mais crianças e adolescentes. Levando-se em conta esse segmento hoje, a juventude constitui a maioria nas igrejas. Uma pesquisa do Datafolha, de 2020, revela que cerca de 12,4 milhões de jovens com idades de 16 a 24 anos se declaram evangélicos, enquanto 13,7 milhões de pessoas nessa faixa etária dizem professar o catolicismo. Sendo assim, o Brasil caminha a passos largos para se tornar predominantemente evangélico em poucos anos. Em meu livro, desenvolvo a tese de que a juventude brasileira se tornará hegemonicamente evangélica, porém menos comprometida com as comunidades religiosas. Embora os jovens se identifiquem como evangélicos e se familiarizem com a subcultura evangélica, não significa que estejam se tornando cristãos fervorosos na prática. Eles tendem a ser menos comprometidos com as estruturas religiosas institucionais se comparados às gerações anteriores.

Qual é o papel da juventude na Igreja da atualidade?

Ela é a força, criatividade, alegria e renovação da Igreja. O papel dos jovens é oxigená-la, demonstrando empenho, serviço, inclusão e diálogo. A juventude evangélica deve se dedicar à inserção dos grupos minoritários e dos indivíduos socialmente invisíveis.

Como a juventude evangélica se relaciona com as igrejas?

Apesar de muitos jovens se identificarem como evangélicos, eles manifestam uma baixa institucionalidade. É trabalhoso fazer com que sejam frequentadores dos cultos. Em minha pesquisa de campo, realizada de 2018 a 2020, dois terços dos estudantes evangélicos entrevistados disseram frequentar a igreja raras vezes durante o mês. Creio que esse dado reflete a realidade nacional.

As igrejas evangélicas têm investido na evangelização dos jovens?

Em sua maioria, elas investem bastante na cristianização deles, o que é diferente de evangelizar. A entrega de panfletos evangelísticos e a execução de cultos e eventos não consiste em evangelização, que, à luz do Novo Testamento, está conectada a um processo mais profundo: relacionamento interpessoal, discipulado e serviço. Investe-se muito em cristianização e pouco em evangelização.

Qual é o principal desafio que a liderança evangélica enfrenta com relação aos jovens?

Estabelecer o diálogo. Há um abismo de gerações entre líderes e liderados. Independentemente da aproximação etária entre eles – alguns líderes de juventude têm de 22 a 25 anos –, há um adensamento da distância natural entre as gerações. Existe ainda a barreira da inflexibilidade. A juventude não encontra um ambiente aberto para dialogar, porque as lideranças de jovens são fechadas para isso. Os pastores e líderes devem buscar estabelecer uma cultura dialogal nas comunidades de fé. Isso começa com o abandono do autoritarismo, das imposições e das estruturas fixas.

Essa juventude está comprometida com o avanço do Evangelho?

Há um compromisso com o avanço da subcultura evangélica, mas uma tímida responsabilização com o progresso do Evangelho no mundo. A juventude segue o mesmo padrão da Igreja no Brasil: um envolvimento pequeno com a obra missionária.

O que a juventude espera da Igreja?

Em 2014, apresentei um estudo de campo realizado com jovens que haviam saído da Igreja. Descobri que a principal razão era a incompatibilidade que tinham com a visão institucional. Para os dissidentes, o discurso mantido pela instituição não fazia diferença na vida deles. Resultado semelhante aparece na pesquisa de Thom S. Rainer e Sam S. Rainer, que se tornou o livro Igreja essencial: resgatando uma geração que está abandonando a fé [publicado no Brasil pela Editora Palavra]. Ambos conduziram um estudo com jovens cristãos estadunidenses com idades de 18 a 22 anos, o qual revelou que 70% deles abandonaram a igreja ao ingressarem na universidade. Segundo os autores, os estudantes que vão à igreja deixam de frequentá-la porque não a consideram essencial para as suas vidas. Os jovens, no Brasil e em outras partes do mundo, esperam que a Igreja faça sentido para eles.

Rodolfo Capler
Pastor, teólogo e pesquisador

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