Entrevista | Revista Graça/Show da Fé
Internacional
20/09/2023
Capa | Evangelização
25/09/2023
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25/09/2023
Foto: Arquivo pessoal

Em defesa dos vulneráveis

Diretora-executiva da ONG CERVI diz que a Igreja precisa ser mais atuante no combate à violência contra a mulher e ao aborto

Por Patrícia Scott

A última edição da Pesquisa Nacional de Aborto (PNA), realizada em 2021, mostrou que uma em cada sete mulheres brasileiras com idade próxima aos 40 anos já fez pelo menos um aborto. O levantamento ainda indica que mais da metade (52%) delas tinha até 19 anos quando realizou o procedimento. Segundo a mesma sondagem, uma em cada três mulheres brasileiras (33,4%) acima de 16 anos já sofreu violência doméstica ou sexual de parceiros, segundo informações do Fórum Brasileiro de Segurança Pública (FBSP). Foram 18 milhões de vítimas em 2022, mais de 50 mil por dia.

É no enfrentamento dessas questões, as quais assolam tanto a nossa sociedade, que atua o Centro de Reestruturação para a Vida (CERVI), com sede no bairro da Água Branca, zona oeste de São Paulo (SP). Com 23 anos de atividade, a instituição é suprapartidária e suprarreligiosa, porém pauta-se nos princípios da Palavra de Deus. Seu objetivo é oferecer assistência integral a mulheres, casais e crianças em situação de vulnerabilidade econômica e social, agindo também com vistas ao fortalecimento de vínculos familiares. “Percebemos que isso é de extrema importância no processo de acolhimento”, informa Rose Santiago, diretora-executiva do CERVI e membro da Igreja Batista da Água Branca. Nesta entrevista à Graça/Show da Fé, ela fala sobre a atuação da organização no combate à violência contra a mulher e ao aborto, principalmente em casos de gravidez inesperada.

Como funciona o trabalho do CERVI?

Prestamos atendimento às mulheres vítimas de abuso, violência sexual e/ou doméstica, às que já realizaram aborto e àquelas que vivenciam uma gravidez inesperada. Depois de acolhidas, realizamos um trabalho de fortalecimento dos vínculos familiares, por meio de uma equipe multidisciplinar. 

As mulheres ainda são resistentes a denunciar os casos de violência? 

Sim, por inúmeros fatores. Entre eles, o medo. Há diversas histórias de ameaça, como: ‘Se você me denunciar, posso ser preso, mas vou voltar para matar nossos filhos’. Além disso, muitas não têm forças para sair da situação, sentem-se sozinhas e envergonhadas. É importante não julgar. Algumas vezes, elas não conseguem reagir por viver em cárcere privado. No entanto, as várias campanhas nacionais têm feito diversas mulheres denunciarem os abusos.

Faltam políticas públicas para combater a violência contra a mulher?

O Brasil possui várias formas de atendimento para esse problema, porém isso precisa ser mais divulgado. Temos uma rede de apoio para a vítima de violência, com atendimento humanizado nos abrigos e centros de referência, na Defensoria Pública, nas Delegacias da Mulher, no Ministério Público, no Juizado de Violência Doméstica e da Família e por meio da central de atendimento 180, em casos de estupro. Há ainda o Disque 100, o CRAS [Centro de Referência de Assistência Social] e o CREAS [Centro de Referência Especializado de Assistência Social], e a Polícia Civil e a Militar podem ser acionadas. Além disso, existe o serviço de responsabilização e educação do agressor, que tem vínculo com o Sistema Judiciário, para que ele também seja alcançado.

Como a Igreja pode ajudar no combate à violência contra a mulher?

Dando suporte às vítimas. Em primeiro lugar, é preciso que a Igreja esteja atenta ao problema. Quantas mulheres vão para os cultos machucadas? Em segundo lugar, as comunidades cristãs precisam criar uma rede de apoio, a qual fale sobre o assunto sem julgamentos, tanto para as mulheres quanto para os homens. Em terceiro lugar, é necessário acolhê-las e auxiliar a família delas. Há dois livros que sempre indico: O Grito de Eva, de Marília de Camargo César [Thomas Nelson], e Feridas Invisíveis, de Mary Susan Miller [Summus Editorial]. Ambos abordam a questão dentro do contexto evangélico. 

Como o CERVI acompanha a mulher diante de uma gestação inesperada?

A primeira coisa que dizemos é: ‘Você não está sozinha’. Acolhemos e oferecemos uma escuta de qualidade. Já tivemos casos em que o pai queria assumir a criança, mas a mãe, não. Quando ressaltamos que podemos ajudar, a mulher ou o casal se sentem mais seguros. A partir daí, inicia-se o atendimento com psicóloga, doula [assistente de parto], nutricionista, musicoterapeuta e psicopedagoga. Disponibilizamos ainda roda de conversa e curso de gestante. Há uma equipe multidisciplinar, e, por meio dela, trabalhamos também com o familiar que irá apoiá-la e acompanhá-la. Nesses 23 anos de existência, fizemos 20 mil atendimentos a cerca de nove mil mulheres. Desse total, se 0,01% abortou depois que passou pelo CERVI foi muito, o que é resultado do acolhimento.

E no caso de a gestante ser uma adolescente?

Damos o mesmo suporte, no entanto, é necessário que ela esteja acompanhada de um responsável. Temos a roda de conversa chamada Jovens Mães, que atende meninas de 12 a 19 anos. Se a jovem e a família decidirem entregar a criança para adoção, damos os esclarecimentos necessários.

Como a Igreja deve atuar em casos de gravidez indesejada?

Antes de tudo, deve oferecer ações preventivas a essas mulheres. São necessárias iniciativas de reflexão, e não de imposição; por isso, as comunidades de fé não devem julgá-las ou excluí-las. O acolhimento é fundamental, mas com orientação para que tal experiência não se torne algo comum. Também é preciso acolher a família delas. Jesus sempre advertiu sobre o pecado, mas perdoou o pecador. Devemos falar a verdade, em amor, levando-as a pensar, a partir dos ensinamentos bíblicos. Despertá-las sobre a importância de esperar por um relacionamento saudável, um casamento, conforme a Palavra de Deus orienta, é necessário para elas refletirem e não haver reincidência de gravidez não planejada.

Que ações práticas a Igreja poderia desenvolver no combate ao aborto?

A Igreja prega muito contra o aborto. No entanto, quando se é contrário a algo, cria-se uma animosidade que, muitas vezes, afasta as pessoas. Não existe discussão: a vida começa na concepção e não matarás é mandamento bíblico. A Igreja precisa destacar a relevância da vida, segundo aquilo que o Criador planejou. Cremos que toda vida é um milagre e que o ventre foi o lugar escolhido por Deus para desenvolver o Seu sonho. É preciso defender a vida da mulher, do bebê e da família, tudo isso com acolhimento e amor.

Rose Santiago
Diretora-executiva do CERVI

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