Falando de História | Revista Graça/Show da Fé
Medicina e Saúde – 249
01/04/2020
Igreja
01/04/2020
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Abraão de Almeida

Os neólogos


Antes de considerarmos alguns nomes do liberalismo teológico, convém ressaltar os principais responsáveis pela transição do escolasticismo protestante para a teologia liberal, ocorrida no período de 1740 a 1800. Por suas novas ideias, foram eles chamados de neólogos.

Johann Salomo Semler (1725-1791), teólogo luterano alemão, desenvolveu os princípios da crítica textual da Bíblia e procurou distinguir duas religiões: uma privada e outra pública, sendo a primeira uma questão de consciência, e a segunda, assunto de natureza política. Semler escreveu 171 obras, nas quais defende uma reforma radical na teologia, exigida pela ciência. Foi o primeiro a distinguir entre religião e teologia.

Gotthold Ephraim Lessing (1729-1781), dramaturgo e teólogo alemão, defendia que o ideal para o homem não é ser moral, e sim desenvolvido ao máximo de seu potencial. Esse alvo, segundo Lessing, é alcançado apenas quando o homem se liberta de inibições devido a preconceitos e ideias. Ele conclui que a particularidade de qualquer religião, inclusive do cristianismo, é a superstição. Suas últimas obras revelam sua fé no progresso da humanidade por uma igreja humanitária, além do cristianismo.

Por sua vez, Johann Gottfried Herder (1744-1803) – escritor, teólogo, filósofo alemão e discípulo de Immanuel Kant (1724-1804) – acreditava no cristianismo como sendo a verdadeira religião da humanidade. No entanto, fazia a distinção clara entre dogma e religião, entre doutrina e piedade. Antecipou conceitos da crítica racionalista das histórias evangélicas. Para Herder, o ideal para o homem é perseguir a verdade, só por ser verdade, defendendo assim a completa liberdade para o espírito humano.

Criticismo bíblico – O liberalismo teológico não é uma religião ou uma organização ideológica possuidora de templos, funcionários ou sociedades. É uma tendência de ajustar o cristianismo à ciência e às filosofias modernas. Essa tendência se apresenta hoje sob diversos títulos, tais como modernismo, racionalismo, nova teologia.

Por seu próprio caráter, o liberalismo encontra relativa facilidade para influir nas seitas e religiões de todos os credos, desagregando-lhes as estruturas doutrinárias, particularmente nos arraiais evangélicos, onde a liberdade para estudar e interpretar as Sagradas Escrituras, segundo a compreensão individual do leitor, é atributo de que não se abre mão.

Os fundamentos históricos dessa tendência remontam, de acordo com a maioria dos autores, ao ano de 1753, quando Jean Astruc (1684-1766), francês incrédulo e professor de Medicina em Paris, publicou anonimamente, em Bruxelas, em francês, o livro Conjecturas sobre as memórias originais que parece terem sido usadas por Moisés na composição do Gênesis. Na obra, Astruc, que foi médico do rei da Polônia e de Luís XV, da França, duvida da origem mosaica dos cinco primeiros livros do Antigo Testamento. Ele aventa a hipótese de existirem duas fontes literárias – javista e eloísta – partindo-se dos nomes usados para se referirem a Deus. Antes dessa data, muito raramente alguém ousava criticar assim a Palavra, lançando dúvidas sobre a sua historicidade tradicionalmente aceita.

Em 1780, o hebraísta alemão Walther Eichrodt (1890-1978) acreditou na hipótese de Astruc e afirmou que os referidos documentos tinham características, estilos e expressões distintas um do outro. Em 1798, outro alemão, Karl David Ilgen (1763-1834), julgou ter descoberto, dentro do documento eloísta do Gênesis, diversos traços de estilo e expressões. Por isso, foi considerado o descobridor do segundo documento eloísta.

Por ser demasiadamente extensa a lista dos principais nomes que veicularam até nós o criticismo bíblico nos últimos 150 anos, deixamos de nos referir a eles, observando apenas que quase todos, partindo do mesmo princípio de Astruc, ampliaram muito as pesquisas anteriores e chegaram às mais fantasiosas e dissonantes conclusões.

Esses 200 anos de cansativas buscas resultaram no surgimento de várias hipóteses, destacando-se:

– A hipótese fragmentária (De Wette e outros): segundo a qual o Pentateuco teria surgido de inúmeros fragmentos, sem quaisquer planos ou unidade.

– Germinante ou complementar (E. Wald, E. Schrader): sugere um documento que é eloísta como base, revisto pelo documento javista, e que recebeu inúmeros acréscimos, seções e anotações, formando assim o documento deuteronomista, mais recente.

– Documentária(Hupfeld, Graf-Welhausen): ensina ter havido quatro documentos originais: eloísta, javista, deuteronomista e sacerdotal.

Para o pesquisador Rudolf Pfeiffer (1889-1979), o documento javista, o qual, de acordo com outros críticos, teria surgido em 650 a.C., e o eloísta, da mesma forma datado de 650 a.C., foram combinados por um redator no mesmo ano. A esse teria sido juntado, em 550 a.C., o documento deuteronomista, que outros críticos datam de 621 a.C..

A Hipótese documentária – chamada de Graf-Welhausen (ou tese das fontes) – é a mais aceita pelos críticos das Escrituras Sagradas. Ela afirma que alguém, depois do cativeiro babilônico, compilou o Pentateuco, que foi então publicado pelo sacerdote Esdras. Segundo esses críticos, Moisés não teria escrito nada.

Os mesmos métodos de desintegração aplicados ao Antigo Testamento foram também aplicados, de maneira violenta, ao Novo Testamento, lançando descrédito sobre o seu valor histórico e resultando, em alguns casos, no completo desaparecimento da pessoa divina de Jesus Cristo, para instalar, em seu lugar, apenas um profeta destituído de todos os seus atributos sobrenaturais.

Do emaranhado dessas teorias nasceu o movimento liberalista, hoje presente nas artes, na música, nos costumes sociais e, como vimos, na própria Teologia. É ele o principal responsável pelo relaxamento dos padrões éticos, em virtude da sua atitude irreverente em relação à Divindade e das dúvidas acerca da inspiração das Escrituras que lança nos corações. Sem a poderosa influência moralizadora da Palavra de Deus, os homens se embrutecem, como descreve o apóstolo Paulo no capítulo 2 da sua carta aos Romanos.

Abraão de Almeida
Pastor da Igreja Evangélica Brasileira em Coconut Creek, Flórida, EUA, e autor de mais de 30 livros em português e espanhol. E-mail: abraaodealmeida7@gmail.com

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